sede

 Será que tudo é mesmo tão familiar quanto parece? Gostava tanto da mística do bloqueio criativo que agora é como se a facilidade com a qual as palavras escoem dos meus dedos me decepcionasse. Feito a areia daquela praia que me sujou mesmo dentro de casa, os grãos de sal do mar que me bate agressivo, mas que não me rejeita. 


A familiaridade mata um pouco do romance, a relação que é tão distante que se torna um sonho de si mesma. Como pode nós dois, sempre correndo contra o tempo, nos recusando a esperar por algo que não pode jamais se concretizar. 


Sentada num boteco qualquer a duas quadras da praia de Copacabana, dou goles minúsculos numa água de coco como quem implora para o tempo parar. Já ele, agora sentado de frente para mim, não mais na diagonal, devora sua água de coco como quem precisa imediatamente ter todo aquele sentimento de uma vez. A conversa vai. Será que é conversa pedir, suplicar, pelas atualizações minuciosas da vida que você queria poder participar?


Ele me conta que hoje já não tem o mesmo espaço para mim, alguém chegou e fincou sua própria bandeira ali que me foi oferecido. Eu conto o mesmo, nós dois já não estamos tão livres quanto antes, ainda que a falta de liberdade não seja o único motivo para não estarmos no mesmo lugar. 


Palavras vazias sobre assuntos supostamente relevantes que são jogadas aos ventos torcendo para que não sejam retribuídas. Esperando ansiosamente pelo silêncio que finalmente dará lugar para o beijo, o romance. Cadê o romance?


Um falso compromisso com a pontualidade disfarça a pressa para o próximo passo. Uma certeza esquisita de que nada jamais será certo, apenas a vontade.


E assim progredimos, do boteco para a casa, da sala para o quarto, do quarto para a cama, do sapato para o vestido, tudo vai embora. E como se tudo aquilo fosse surpresa, acontece desengonçado, sem palavras. Horas e horas se passam e todos os assuntos acabaram. Resta apenas, finalmente, o silêncio avassalador que entregou todo o calor que prometeu. 


Uma tentativa pífia de novas palavras inventadas são jogadas de forma agora preguiçosa, como de quem já conseguiu o que queria. Promessa vazia de se encontrar de novo que fica no vapor que cobre a vista do quarto agora abafado, suado. 


Onde fica a pressa da vontade impossível?

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