tentativa e erro
Tudo que se planeja demais é ruim. Tudo aquilo que se deseja, decepciona Queria estar ali, há muito tempo. Já estive em outros lugares, mas antes de sair de casa, sempre quis estar exatamente ali. Só consegui ir uma vez, foi demais para mim, marcante demais, de um jeito ruim, do pior jeito possível. Nunca mais voltei.
Aos 15 anos, sonhava em sair com minhas amigas, ir para a balada, ter uma vida amorosa conturbada. Falava dos mesmos assuntos que todas as outras meninas de 15 anos, como perderia minha virgindade, como seria meu primeiro beijo, meu primeiro amor. Planejava tudo como se estivesse escrevendo um conto de fadas do século XXI.
Fazia listas de tudo que queria em um pretendente perfeito: cabelo cacheado, um pouco mais alto do que eu, barba por fazer, poucos anos mais velho talvez, que cursasse alguma coisa interessante como história, letras, queria me relacionar apenas com pessoas sensíveis. Conheci alguns, nunca me senti segura.
Algo sobre a masculinidade tornava todos iguais àqueles que me causavam nojo. Me apaixonei algumas vezes quando ainda podia ter a primeira vez, todas mal resolvidas, todas por homens que entravam perfeitamente nos meus planos.
Meu primeiro beijo seria mágico, uma história de amigos que se apaixonam lentamente, onde a iniciativa jamais seria minha. Esse era meu plano. Ia continuar uma amizade bonita e inocente, até um dia, quando todos os nossos amigos estivessem distantes, e enfim uma paixão floresceria. Com quem eu viveria esse momento, eu nunca soube.
Meu primeiro beijo já tinha acontecido, há muito tempo, com um amigo, com uma amiga, com vários deles, mas nunca contei nenhum, não tinha paixão, era apenas beijo. A realidade foi que nasci sabendo beijar.
Meu primeiro beijo foi com alguém que preenchia meus requisitos perfeitamente. Um pouco mais alto, cursando filosofia, gostava de The Smiths, fumava cigarro de menta, só era um pouco mais velho demais, mas isso parecia legal com 16 anos. Meu primeiro beijo foi como os outros, intenso demais para meu próprio bem. Pouco se fala das mulheres que nascem oblíquas e dissimuladas, sem um pingo de infantilidade no amor.
Tinha 16, minha primeira grande paixão se foi pela minha incapacidade de entender os sinais pequenos, comigo tudo sempre teve que ser gigante. Ouvia minhas amigas me contando sobre como perderam ou perderiam a virgindade. Sabia como eu queria também.
Seria entre as 16h e as 17h, para que fosse durante o pôr do sol, seria no meu quarto, em algum momento em que meus pais não estivessem em casa, seria com meu namorado e estaríamos juntos há exatos 6 meses. Eu não tinha nem o namorado, nem o quarto, nem a vontade.
Ainda assim, contra minha vontade, aos 18 anos, aconteceu.
Dos 15 aos 18, sempre quis sair com minhas amigas para beber. Escolhíamos as baladas que iríamos assim que fizéssemos 18, uma em específico parecia perfeita. Nossos amigos mais velhos gostavam de lá, era descolada, alternativa, tocava músicas que gostávamos e parecia ter o tipo de gente que queríamos conhecer.
No meu aniversário de 18, não fomos lá, já tinha brigado com aquelas amigas e meu novo grupo de amigos preferiu outro lugar. Meu aniversário foi ótimo, mas já não era minha primeira vez numa balada. O final dos meus 17 anos foi muito mais maduro do que meus 18.
Mesmo com tantas mudanças e tanto vai e vem de confidentes, uma amiga sempre esteve comigo, desde que nasci. E foi no aniversário dela de 18 anos que, finalmente conheci a balada que queria tanto ir. Já tinha conhecido todas as outras daquela mesma rua, alguma coisa me impedia de entrar justamente naquela.
Chegamos, tudo era perfeito, estava tão feliz que queimei a largada. Acho que isso define minhas primeiras vezes. Conheci um conhecido de alguém que minha amiga conhecia. Confiei, me arrependi muito tempo depois. Planejei demais, a balada, a bebida, a droga, o toque, a inocência que nunca tive e que foi roubada.
Me recusei a aceitar que aquilo não tinha sido bom. Fiquei mais tempo no aniversário da minha amiga do que ela, que foi embora duas horas antes da tragédia. Caí na rua, sangrei, fui carregada, pouco daquele dia foi feito com minhas forças. Me ajudaram, me resgataram, tudo foi tarde.
6 anos depois e só agora consigo enxergar o que sai de mim. 6 anos com a dor latente, escondida, anestesiada pelo que veio depois.
Um mês antes do fatídico aniversário, conheci ele, meu primeiro amor. Não sabia que seria, ele não preenchia meus requisitos, mas eu fiz preencher. Conheci um menino qualquer, um ano mais velho, careca, um pouco mais alto, mas muito pequeno. Em 6 anos o transformei num homem de cabelo cacheado, da altura perfeita, do tamanho perfeito para encaixar em mim, que cursou letras, que trabalha com arte. Artista ele sempre foi.
Hoje, com seu fim, consigo voltar a olhar para o que me quebrou. Passei 6 anos amando duas pessoas diferentes, aquela que me amava e aquela que eu queria amar. Um dia conciliar esses dois ficou difícil e ele percebeu que olhava através dele. O fim dele foi meu retorno.
Tento lembrar então da primeira vez que queria ter tido. Estávamos juntos há exatos 6 meses quando começamos a namorar. Até então, tudo era casual mas na verdade nunca foi nada que não puro pacto de alma. Eu nunca soube ter um romance infantil. Estávamos em grupo, com outros amigos, quando conseguimos ficar sozinhos, formalizamos nosso pacto e partimos a concretizá-lo. Tudo foi bom, cheio de nervosismo, performances do que deveria ser feito.
Embora tivesse o histórico corrompido, estava com uma tela em branco. Descobri que não fui só eu que nasci sabendo, ele também.
Hoje tento me recordar de outras primeiras vezes além da primeira, para ver se consigo ter a segunda. Tudo foi estranho, o nervosismo da primeira vez era óbvio, mas ainda assim foi bom. E ficou bom, até me lembrar da minha primeira vez. Como será sentir um toque sem tanto temor? Beijar alguém sem o medo de desmaiar de tanto amor?
Não quero mais sentir tanto quanto senti, mas sei que logo as emoções virão, apenas quero que não venham como maremoto, quero mais segundas vezes, estou cansada das primeiras.
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